sábado, 24 de agosto de 2013

Somos propriedade particular, mas não pertencemos a ninguém, senão a nós mesmos


               Num mundo cada vez mais materialista, possuir posse e domínio de alguma coisa, tornou-se uma tendência natural humana. É a força devastadora do capitalismo, a persuasão do consumismo, o ataque provocador do modernismo, a fragilidade do comodismo e, assim, o que nos resta é cair num abismo cheio de "ismo"...

            "É meu!", "é minha!", "isso me pertence!"... quantas afirmações convictas expressamos sobre determinado objeto sujeito ao nosso uso e aproveitamento... é uma caneta, um relógio, uma bolsa, um carro, uma casa, etc. "É meu!", "é minha!", "isso me pertence!"... será que ser proprietário de algum bem é um mal necessário? Ou será o apego inevitável?
 
            Tanto se acostumou a ter, que esquecemos de simplesmente ser. Há pessoas, inclusive, que acreditam ser dono de outra pessoa. Mas, como assim? Embora o corpo seja matéria, pode alguém possuí-lo? Adquiri-lo? E pegar pra si como se fosse meramente um pedaço de carne? Pode um indivíduo pertencer a outro, com base em argumento puramente patrimonialista?

            Esta presente "poerídica" propõe falar sobre a posse e o domínio, estendendo o assunto até a consideração da pessoa como propriedade. Desse modo, cabe não somente discutir, mas também sensibilizar a respeito do tema.

 
A propriedade no mundo jurídico
 
            O direito de propriedade é cláusula pétrea, previsto no "caput" e no inciso XXII do artigo 5º da Constituição Federal.
 
            Assim, todo e qualquer proprietário deve atribuir uma função social à sua propriedade. Quer dizer que esse seu direito de constituir patrimônio não é meramente um direito subjetivo, muito menos um direito absoluto. “A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: II propriedade privada; III função social da propriedade privada” (art. 170, II e III da CF).
            Cumprir a função social, como demanda o texto constitucional, é promover a propriedade particular para o bom convívio coletivo, ou como orienta o parágrafo 1º do artigo 1.228 do Código Civil:

            "O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas."

 
Somos ou não somos propriedade?
 
            Direito de adquirir e constituir patrimônio nós temos. E o direito de sermos considerados patrimônio? Propriedade, seja material ou imaterial, é coisa de determinado valor monetário, histórico, urbanístico, arquitetônico, cultural e sentimental. E será que o ser humano pode ser classificado como bem? Bem de consumo ou bem permanente?
 
            "Toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil" assim inicia o nosso Código Civil. Então, se tratando de pessoa capaz, consciente e independente, pode-se entender - à luz da filosofia jurídica - que o ser humano possui o direito de usar, gozar, dispor e de reaver a si próprio.
 
            Porém, o princípio da dignidade da pessoa humana e os direitos humanos não autorizam, de forma alguma, alguém ser considerado propriedade de outro. Ninguém pode ser escravo ou refém do interesse alheio.
 
Artisticamente, tudo é possível
 
            O cantor e compositor Lulu Santos já definiu na canção "propriedade particular", uma situação em que alguém deseja sentir pertencido a outra pessoa, conforme o trecho da letra: "Queria que tu tivesses ciúmes de mim,  queria te ver armar uma cena assim, xingando e quebrando coisas, subindo em mesa de bar, dizendo 'aqui ninguém tasca, é propriedade particular' "
 
            E agora, a "poerídica" permite a nomeação de propriedade dada à pessoa, porém, com merecidas ressalvas e com todo devido respeito.

 
Poerídica: Somos propriedade particular

 
Eu sou proprietário de mim.

Sou único e exclusivo titular.

Saiba que ninguém me possui,

só Deus pode me desapropriar.

 

Por mais que o amor influencie

na ideia de pertencer a alguém,

sentimento que envolve matéria

não atrai o coração de ninguém.

 

Embora eu goste de fazer o bem,

não sou bem de uso comum.

Não poderá usar, gozar e dispor

achando que eu sou qualquer um!

 

Eu sou propriedade privada

que cumpre a função moral

dada pelos direitos humanos

e pela propriedade intelectual.

 

Não alugue o meu tempo,

pois não sirvo para locação.

Não restrinja os meus sonhos,

pois aqui não cabe intervenção.

 

Eu pertenço às minhas ideias

e não ao ideal alheio.

Meu tesouro inestimável

estão nos sentimentos que semeio.

 

Trata-se de Direito Público

o que interessa a coletividade.

E trata-se de Direito Privado

a nossa íntima intimidade.

 

Contudo, se eu te chamar de "minha"

não é no sentido patrimonial,

é como direito personalíssimo

de quem te ama por igual.

 

Então, se eu te chamar de "meu bem",

não faço referência ao bem material,

só quero dizer que você é fundamental

para que eu esteja bem...

 

Por fim,

você jamais será minha propriedade,

eu jamais terei o domínio sobre você,

mas, apenas gostaria de ter a posse...

....a "possebilidade"

de estar sempre ao seu lado.

 

0 comentários:

Postar um comentário