Num
mundo cada vez mais materialista, possuir posse e domínio de alguma coisa,
tornou-se uma tendência natural humana. É a força devastadora do capitalismo, a
persuasão do consumismo, o ataque provocador do modernismo, a fragilidade do
comodismo e, assim, o que nos resta é cair num abismo cheio de
"ismo"...
"É meu!", "é
minha!", "isso me pertence!"... quantas afirmações convictas
expressamos sobre determinado objeto sujeito ao nosso uso e aproveitamento... é
uma caneta, um relógio, uma bolsa, um carro, uma casa, etc. "É meu!",
"é minha!", "isso me pertence!"... será que ser
proprietário de algum bem é um mal necessário? Ou será o apego inevitável?
Tanto se acostumou a ter, que esquecemos de simplesmente ser. Há pessoas, inclusive, que acreditam ser dono de outra pessoa. Mas, como assim? Embora o corpo seja matéria, pode alguém possuí-lo? Adquiri-lo? E pegar pra si como se fosse meramente um pedaço de carne? Pode um indivíduo pertencer a outro, com base em argumento puramente patrimonialista?
Esta presente "poerídica"
propõe falar sobre a posse e o domínio, estendendo o assunto até a consideração
da pessoa como propriedade. Desse modo, cabe não somente discutir, mas também sensibilizar
a respeito do tema.
A propriedade no mundo jurídico
O direito de propriedade é cláusula
pétrea, previsto no "caput" e no inciso XXII do artigo 5º da
Constituição Federal.
Assim, todo e qualquer proprietário
deve atribuir uma função social à sua propriedade. Quer dizer que esse seu
direito de constituir patrimônio não é meramente um direito subjetivo, muito
menos um direito absoluto. “A ordem econômica, fundada na valorização do
trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência
digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes
princípios: II propriedade privada; III função social da propriedade privada”
(art. 170, II e III da CF).
Cumprir a função social, como demanda
o texto constitucional, é promover a propriedade particular para o bom convívio
coletivo, ou como orienta o parágrafo 1º do artigo 1.228 do Código Civil:
"O direito de propriedade deve ser
exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo
que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a
flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio
histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas."
Somos ou não somos
propriedade?
Direito de
adquirir e constituir patrimônio nós temos. E o direito de sermos considerados
patrimônio? Propriedade, seja material ou imaterial, é coisa de determinado
valor monetário, histórico, urbanístico, arquitetônico, cultural e sentimental.
E será que o ser humano pode ser classificado como bem? Bem de consumo ou bem
permanente?
"Toda pessoa
é capaz de direitos e deveres na ordem civil" assim inicia o nosso Código
Civil. Então, se tratando de pessoa capaz, consciente e independente, pode-se
entender - à luz da filosofia jurídica - que o ser humano possui o direito de
usar, gozar, dispor e de reaver a si próprio.
Porém, o
princípio da dignidade da pessoa humana e os direitos humanos não autorizam, de
forma alguma, alguém ser considerado propriedade de outro. Ninguém pode ser
escravo ou refém do interesse alheio.
Artisticamente, tudo é possível
O cantor e compositor Lulu Santos já
definiu na canção "propriedade particular", uma situação em que
alguém deseja sentir pertencido a outra pessoa, conforme o trecho da letra:
"Queria que tu tivesses ciúmes de mim,
queria te ver armar uma cena assim, xingando e quebrando coisas, subindo
em mesa de bar, dizendo 'aqui ninguém tasca, é propriedade particular' "
E agora, a "poerídica" permite
a nomeação de propriedade dada à pessoa, porém, com merecidas ressalvas e com todo
devido respeito.
Eu sou proprietário de mim.
Sou único e exclusivo titular.
Saiba que ninguém me possui,
só Deus pode me desapropriar.
Por mais que o amor influencie
na ideia de pertencer a alguém,
sentimento que envolve matéria
não atrai o coração de ninguém.
Embora eu goste de fazer o bem,
não sou bem de uso comum.
Não poderá usar, gozar e dispor
achando que eu sou qualquer um!
Eu sou propriedade privada
que cumpre a função moral
dada pelos direitos humanos
e pela propriedade intelectual.
Não alugue o meu tempo,
pois não sirvo para locação.
Não restrinja os meus sonhos,
pois aqui não cabe intervenção.
Eu pertenço às minhas ideias
e não ao ideal alheio.
Meu tesouro inestimável
estão nos sentimentos que semeio.
Trata-se de Direito Público
o que interessa a coletividade.
E trata-se de Direito Privado
a nossa íntima intimidade.
Contudo, se eu te chamar de "minha"
não é no sentido patrimonial,
é como direito personalíssimo
de quem te ama por igual.
Então, se eu te chamar de "meu bem",
não faço referência ao bem material,
só quero dizer que você é fundamental
para que eu esteja bem...
Por fim,
você jamais será minha propriedade,
eu jamais terei o domínio sobre você,
mas, apenas gostaria de ter a posse...
....a "possebilidade"
de estar sempre ao seu lado.
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